quarta-feira, 1 de setembro de 2010

A morte do poeta


Quando a noite veio, o poeta estava só. Percorreu os livros da estante. Começou a sentir tudo muito lento. Queria escrever sobre o céu azul, mas já havia feito isso. Pensou em girassóis, nas rosas vermelhas, no mar que chorava na ponta da praia, na lua à procura do sol, mas tudo já estava escrito. Ainda assim, sentia um gosto de verso, e da sua boca pingavam na página pálida sílabas silenciosas. Encontrou a agenda perdida no fundo da gaveta. Não havia folhas brancas, todas gritavam poemas.
Admirou o tempo que cobria de anos os dedos magros e irregulares.
O vazio lá fora caía leve dentro dele.
As coisas passam, as palavras enfeitadas nas linhas ficam. A mesma ternura que dedicou à flor, também dedicara à faca. Sua obra estava ali, enfileirada na estante. Durante um ciclo eterno, seus poemas iriam anoitecer e amanhecer.
Pegou um caderno novo e escreveu: “ Deixo branca a página para que a paisagem passe”. Muitos certamente, viriam depois dele.
Lembrando de um amigo que um dia escrevera que quem parte leva um jeito de quem traz a alma torta, o poeta encaminhou-se à janela dando adeus às plenitudes inesperadas. Em meio à madrugada, deu um salto do décimo primeiro andar. O poeta foi sonhar num labirinto de poesias.

Um comentário:

  1. Olá!

    Não a conheço, porém apreciei seu estilo. Percebo a emoção fluindo dos textos. Muito bom.

    Abs.

    Thiago S.

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